NOTA DE REPÚDIO AO DECRETO No 48.819/23 QUE RECRIA A SECRETARIA DE SEGURANÇA PÚBLICA

O Sindicato dos Delegados de Polícia do Estado do Rio de Janeiro/SINDELPOL, entidade classista que representa os delegados de polícia civil do Estado do Rio de Janeiro, vem, de forma veemente, repudiar o Decreto 48.819/23 expedido pelo Governador Claudio Castro, o qual visa recriar a Secretaria de Segurança Pública.

Na data de hoje a entidade classista dos Delegados de Policia, foi surpreendida com a expedição de um decreto de iniciativa do Governador Claudio Castro o qual recria a malfadada Secretaria de Segurança Pública/SESEG. Estrutura administrativa onerosa, lenta e ineficiente, que abrigava diversos apadrinhados políticos e que, em um passado próximo, seu fracasso culminou em uma intervenção federal, sem precedentes, na política de segurança do Estado do Rio de Janeiro.

Causa espécie e perplexidade ao SINDELPOL/RJ a recriação da Secretaria de Segurança Pública quando há menos de um mês o próprio governador concedeu uma entrevista em rede nacional afirmando “que a Secretaria de Segurança não faz a menor falta tanto é que os números sem ela [Secretaria de Segurança Pública] são muito melhores do que quando ela existia” e que a Secretaria “era um “órgão eminentemente político” do qual “vários saíram dali para serem deputados federais e deputados estaduais”. 1

Não existem números claros, dados precisos ou estudos acadêmicos que demonstrem a eficácia e a eficiência de uma Secretaria de Segurança em detrimento do exercício da segurança pública direta através de secretarias autônomas das Polícias do Estado. O que temos, em realidade, é apenas uma análise empírica dos fatos sobre a concretização da política de segurança pública de uma forma ou de outra.

1https://g1.globo.com/politica/blog/andreia-sadi/post/2023/10/03/entrevista-claudio-castro.ghtml

A experiência anterior – do exercício da política de segurança pública através de uma Secretaria de Segurança – demonstrou o total fracasso da ideia na qual o Governador agora volta a insistir, contrariando inclusive seus próprios discursos sobre a desnecessidade e a ineficiência de uma Secretaria Política de Segurança.

Ao longo de 40 anos de existência de SESEG no Estado do Rio de Janeiro, o que de fato a sociedade carioca custeou foi à manutenção de uma estrutura política paquidérmica, propensa a ser titularizada por aventureiros, que nada conhecem do Rio de Janeiro, de segurança pública ou das instituições policiais do Estado, contando com centenas de cargos em comissão ocupados através de indicações políticas obtendo como resultado apenas o aumento exponencial da criminalidade, que culminou, após um longo período de GLO2, em uma intervenção federal. E o pior! Após surrupiar o Setor de Inteligência (SSint) e a Delegacia de Repressão aos Crimes Organizados (Draco) da estrutura da Policia Civil, ganhando poder de informação e capacidade operacional, a SESEG se tornou uma verdadeira Polícia Política que serviu de instrumento de perseguição a inimigos e de beneplácitos para amigos.

Tanto é assim, que nos dez anos em que o Rio de Janeiro foi saqueado pela classe empresarial e política, a Secretaria de Segurança Pública existente à época nada percebeu, detectou ou investigou. O próprio secretário de segurança pública residia no apartamento de um possível “laranja” do Governador3 e andava em seu iate em Angra dos Reis4.

Em tempos também não muito distantes, a Secretaria de Segurança Pública também foi responsável pela implantação do projeto fracassado de 38 UPPs que, até mesmo para qualquer leigo, era evidente que se tratava de um projeto insustentável a longo prazo5; e mesmo com a disponibilização de orçamentos recordes, alcançando muitas vezes a soma dos orçamentos destinados à Educação e a Saúde do Estado6, foi responsável pelos números alarmantes de violência que culminaram na sua extinção.

2https://www.defesanet.com.br/mout/noticia/16235/operacao-de-glo-na-favela-da-mare-no-rio-eprorrogada-ate-31-de-outubro/
3https://veja.abril.com.br/politica/justica-prorroga-prisao-de-laranja-de-cabral
4https://veja.abril.com.br/brasil/ex-assessor-se-torna-delator-e-fala-sobre-iate-de-sergio-cabral
5https://brasil.elpais.com/brasil/2018/03/11/politica/1520769227_645322.html

É fato incontroverso que o Estado do Rio de Janeiro precisa de uma verdadeira política de segurança pública. E nesse ponto cabe a pergunta: Qual é a política de segurança pública do Governador Claudio Castro? Existe alguma política de segurança pública? O que será que fez o Governador tão repentinamente mudar de ideia? Será que o governador efetivamente visa melhorar a segurança pública ou tão somente possui interesse político nas eleições municipais que irão ocorrer em 2024 ou ainda, derradeiramente, busca agradar pessoas que tenham influência sobre a investigação a qual o mesmo é suspeito de corrupção que hoje se arrasta no STJ?

Inegavelmente a Segurança Pública do Rio de Janeiro precisa melhorar. A Polícia Civil necessita de uma verdadeira reforma estrutural. As delegacias estão sucateadas, com o teto caindo7, com infiltrações, sem nenhum plano de combate a incêndio, com as partes elétricas precárias e principalmente, com os policiais civis exaustos e desacreditados. Apesar do aumento da populacional temos 30% menos policiais civis nas unidades policiais do que tínhamos no ano de 2000, chegando a algumas Delegacias no interior do Estado a terem apenas 3 a 7 policiais. A Polícia Civil do Estado hoje atua através de uma política de segurança pública ditada por grupos políticos muitas vezes desconectados da realidade e do real interesse público, outras vezes sequestrada por interesses econômicos ou quiçá, até mesmo por interesses obscuros. Um projeto de segurança pública através de uma Secretaria de Segurança ou mesmo de Secretarias de Policias autônomas – estará sempre fadado ao fracasso quando desacompanhado de verdadeiras reformas estruturais das instituições, do sistema penitenciário e das leis.

6https://extra.globo.com/casos-de-policia/com-beltrame-secretaria-de-seguranca-teve-orcamento-recordeultrapassou-educacao-saude-19635316.html
7https://oglobo.globo.com/rio/noticia/2023/11/26/sindicato-faz-campanha-para-apurar-as-pessimascondicoes-das-delegacias-do-rio.ghtml

Mudar tudo para que tudo permaneça como sempre foi, esse parece ser o lema do Governador Claudio Castro. A sociedade fluminense não pode se iludir. Não há solução fácil para problemas difíceis, não há soluções mágicas e imediatas para problemas estruturais que se arrastam desde 1808. Recriar a Secretaria de Segurança Pública ou permanecer com as policiais em forma de Secretarias autônomas não muda nada. A violência não é a causa e sim a consequência. A violência é o sintoma e não a doença. Temos que combater a doença. A violência vivida hoje no Rio de Janeiro e no Brasil é fruto da falta de oportunidades, de dignidade do trabalho, da desigualdade, do sucateamento da educação e do transporte, da retração econômica, do estimulo as ilegalidades e do exercício de uma política de desmonte do serviço público, da assistência social e da saúde.

Inegavelmente, se nos últimos anos houve um exponencial aumento da criminalidade, da população carcerária e da estrutura prisional8 houve também um severo aumento do número de pessoas na pobreza, sem empregos9, excluídos do consumo e consequentemente de uma vida social digna. Apenas nos últimos anos houve um aumento de 36% de pessoas na extrema pobreza no Estado do Rio de Janeiro10, sendo o Rio de Janeiro o terceiro estado da Federação com o maior número de desempregados.11

O Estado do Rio de Janeiro não possui uma política de enfrentamento a violência e ao crime organizado, assim, o que se busca na realidade, ao recriar a Secretaria de Segurança é apenas uma cortina de fumaça, um factoide, uma medida paliativa, populista e eleitoreira para ludibriar a sociedade e desfocar dos verdadeiros problemas que geram a criminalidade. Fingir que o problema não existe, não faz ele desaparecer. Recriar mais uma vez a Secretaria de Segurança, que comprovadamente não deu certo durante 40 anos é enganar e mentir, dizer que está fazendo algo útil para reduzir a violência, mas em verdade é mais do mesmo, é a simples utilização da máquina estatal administrativa para o alcance de interesses partidários e políticos.

Rio de Janeiro, 27 de Novembro de 2023.
Leonardo Affonso
Presidente do Sindicato dos Delegados do RJ / SINDELPOL-RJ

8https://www.jusbrasil.com.br/noticias/populacao-carceraria-do-brasil-aumentou-mais-de-400-em-20-anos/114455970
9https://g1.globo.com/rj/rio-de-janeiro/noticia/2023/10/13/mais-da-metade-dos-jovens-moradores-defavelas-do-rioestao-desempregados-diz-prefeitura.ghtml

10 https://g1.globo.com/rj/rio-de-janeiro/noticia/2022/12/02/numero-de-pessoas-em-situacao-de-extremapobrezaaumenta-36percent-no-rj.ghtml
11 https://www.brasildefatorj.com.br/2022/05/17/desemprego-no-rj-e-o-3-mais-alto-do-pais-no-primeirotrimestre-de2022-aponta-ibge

Leia por aqui também a nota na íntegra.

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